Quando virá este prémio para Portugal??? NUNCA... com estas políticas lá se vai a alegria de viver para os outros.
Este ano o prémio atribuído pela Sociedade Americana de Administração Pública foi para a Grécia, um país sob escrutínio pelo caos nas contas públicas e pela paralisia nas reformas.
03.05.2012 - 17:03 Por Maria João Guimarães, em Atenas
Uma excepção, eu? Eu não sou uma excepção!", garante
Panagiotis Karkatsoulis (Athina Kazolea)
Panagiotis Karkatsoulis é um homem de entusiasmos. Ele fala, reproduz diálogos fazendo vozes diferentes em que se representa a si próprio (mais grave) e aos outros (mais agudo), gesticula, coça a cabeça, escrevinha diagramas no papel, volta a rabiscar, não consegue estar parado. Às vezes acaba um discurso com um "ufffff - isto fui eu a tentar explicar esta ideia".
Por exemplo, ser visto como uma raridade é algo que inspira uma destas tiradas. Ele indigna-se e ri-se ao mesmo tempo. "Uma excepção, eu? Eu não sou uma excepção!" Mas lembra-se, com uma gargalhada, da reportagem que fizeram quando foi anunciado que tinha vencido o prémio da Sociedade Americana de Administração Pública (atribuído a alguém que tenha promovido mudanças no sector da administração pública), há uns meses. "Foram perguntar a pessoas na Praça Syntagma de que nacionalidade seria o melhor funcionário público do mundo. Um respondeu: "Sueco, finlandês, alemão... grego é que não é de certeza!"". Outro disse apenas: "Qualquer uma, menos grego". E apanharam um britânico esperto que perguntou: "Mas têm estatísticas para saber isso?""
Karkatsoulis trabalha no Ministério da Reforma Administrativa - e por isso tem lidado de perto com responsáveis da troika - e é professor na Escola Nacional de Administração Pública. Recebe-nos no seu gabinete, onde tem várias reproduções, uma, por exemplo, da dupla Gilbert & George, num cor-de-rosa que, hoje, condiz com a sua camisa.
Ele garante que no seu departamento há uma equipa de funcionários públicos muito capazes e dedicados. "Este era um dos departamentos mais bem pagos, com salários de cerca de 3000 euros. Agora, estes salários são de mil e tal euros. Estas pessoas podiam ter ido todas para o sector privado. Mas não foram, ficaram. E trabalham mais horas. Porquê? Não sei, bom, não lhe queria chamar patriotismo..."
A indignação de Karkatsoulis passa, ao de leve, pela pesada e, sim, louca máquina da administração pública grega - um estudo que fez junto com 200 colegas a pedido da troika descobriu que a administração central tem cerca de 23 mil responsabilidades diferentes, e que estas estão a mudar constantemente, numa média de 1140 vezes por ano. Mas hoje, ele desvaloriza isto. "Esses números mostram qualquer coisa: 23 mil competências formais escritas é imenso, blá, blá. Mas, se olharmos com atenção, vemos que todas estas 23 mil competências não afectam os funcionários da mesma maneira, umas continuam lá, mas não estão a fazer nada."
A troika erra ao querer soluções rápidas, ignorando a realidade do país em que está, argumenta. Os seus funcionários não sabem nada do local para onde são destacados. "Já houve quem perguntasse: "Será que isto tem a ver com algo mais profundo, com o vosso ADN?"", conta, a voz já a levantar-se. Mas logo baixa o tom, desculpando-os: "É verdade que estão sob muita pressão".
O que se está a pedir à Grécia "é como se se quisesse que alguém corresse 100 quilómetros em dez segundos enquanto se parece um escravo do século XIX - não é possível", sentencia. "E este é um parâmetro objectivo. Não é uma discussão sobre se o vou fazer, se estou viciado em não o fazer, se não gosto - não é possível."
Outra coisa que o irrita: que pareça que este é um problema fácil. "Ai é? Então por que é que está o mundo todo, [o economista] Paul Krugman, etc., a tentar resolvê-lo?" E o que o chateia ainda mais: "Muitas vezes é-lhe aplicado um pensamento básico, um pouco primitivo. Vem alguém de França e diz: "Reformem isto". A maioria está a tentar transferir a sua própria realidade."
Karkatsoulis está entretanto lançado num novo episódio, já vai alto o tom de voz e amplo o gesticular. "Outro dia estive numa repartição de Finanças a tentar ir tratar de um papel pelo terceiro dia consecutivo e pela terceira vez disseram-me que o sistema tinha ido abaixo. Que raio, pela terceira vez?" Comenta tudo o que lhe passou pela cabeça (aí entra até um leve praguejar). E finalmente faz uma pausa para respirar. "Uffff este foi o meu esforço para dizer que é difícil. Porque parece que nada está a mudar, mas eu digo que tenho pelo menos 100 provas de que sim, está a mudar."Previsão: mais crise
Há um problema de reformas mil vezes anunciadas e nunca feitas na Grécia. Quem não gosta das reformas? "Diga-me você! O sistema? É óbvio que os políticos não querem mudanças. Se querem, por que fazem tudo contra?", desabafa. "Muitas coisas deviam mudar", nota, mas sublinha: "Não só na Grécia, mas em Bruxelas, no FMI, etc., e como não vejo nada disso, a única previsão que faço é que a crise se vai aprofundar."
O que nos leva às eleições. Em quem irá votar Panagiotis Karkatsoulis? "Não sei, estou aberto a sugestões", brinca. "Se se pensar de acordo com critérios racionais, então tem de se votar num dos dois grandes partidos. As coisas estão mal, mas vão ficar melhor. Se, por outro lado, se acreditar que as coisas vão ser assim, tem de se mover para a esquerda ou para a direita." No entanto, ainda há pouco, notamos, Karkatsoulis disse que a situação não ia melhorar. "Não, tenho a certeza de que as coisas vão ficar pior, no sentido de que a crise se vai aprofundar. Mas provavelmente vou escolher um dos dois grandes partidos", diz, explicando: "Porque acho que é mais fácil fazer mudanças através destes partidos, e é muito mais difícil fora. Os mais pequenos vão demorar muito mais tempo a fazer alguma coisa". Compara então a situação actual com o que se passou após a queda da ditadura, com uma proliferação de partidos de esquerda ("e eu estive envolvido nisso, claro, era uma coisa geracional").
Ao contrário dos analistas políticos, Karkatsoulis não vê esta eleição como uma chave para qualquer coisa. "Não acho que seja uma coisa dramática e não valorizo tanto. Acho que o país está em transição e tudo isto vai durar alguns anos."
Quando saímos do seu gabinete no ministério, na Praça Korai, no meio de uma arcada com cafés e Pizza Hut, Karkatsoulis acompanha-nos para explicar que este local esteve ligado à II Guerra Mundial; as arcadas eram aproveitadas para trocas de mensagens entre os gregos que se opunham à ocupação nazi. Saindo da arcada, dois números acima, está uma cave que foi usada como prisão e central de tortura da Gestapo e que é hoje um centro de memória histórica. Karkatsoulis diz que um dia indicou isso a uns funcionários alemães. Eles olharam para o lado. "Não queria deixá-los desconfortáveis", sublinha. "Mas há certas coisas que devíamos ter presentes."
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